A decisão do X (ex-Twitter) de fechar seu escritório no Brasil pode levar a um bloqueio da rede social no país, segundo especialistas ouvidos pelo Poder360. A big tech, comandada por Elon Musk, anunciou neste sábado (17.ago.2024) que o fechamento é em resposta a um embate travado com o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes.
Em processo mantido sob sigilo, Moraes teria pedido o bloqueio de perfis com mensagens antidemocráticas. Em comunicado, a empresa declarou que Moraes teria ameaçado prender o representante legal da empresa no Brasil caso não cumprisse suas ordens e que vai encerrar as operações no país a fim de “proteger a segurança” da equipe.
Assim, o escritório pode deixar o país, mas ainda terá de ter alguém que responda pela empresa caso ela cometa alguma irregularidade em cumprimento ao Marco Legal da Internet, segundo o doutor em direito constitucional Acacio Miranda da Silva Filho. Sem um, ela não poderia operar.
“Acho que, nesse momento, é um blefe. O X e o Musk vêm blefando há um tempo. Se não tem [um representante legal], não cumpre os requisitos para que a empresa seja constituída no Brasil. É uma escolha: se eles deixam de ter representação, consequentemente deixam de ter o X no Brasil”.
Ele explicou, também, que as determinações já feitas contra o X continuam válidas, inclusive as multas aplicadas em caso de descumprimento, “mesmo que não tenha escritório representante legal constituído no Brasil”. E completou: “Nosso Poder Judiciário tem jurisdição em território nacional, independentemente se o jurisdicionado está ou não no Brasil”.
O coordenador dos cursos de direito da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), Marcelo Crespo, também afirmou que pode haver a determinação do bloqueio da plataforma do país, mas que é mais difícil exigir o cumprimento das decisões judiciais sem um escritório no território nacional.
O professor destacou ainda que existem maneiras de se questionar decisões judiciais, diferentemente da medida tomada pelo X.
“No Estado Democrático de Direito a forma de se questionar qualquer tipo de decisão judicial se dá pelos meios processuais disponíveis. Jamais pela simples negativa de cumprimento de uma ordem sob o argumento de que ela é ilegal sob o seu próprio ponto de vista”, declara.
Já Miranda defendeu que não há direito absoluto no Brasil –incluindo a liberdade de expressão expressa por Musk. “Óbvio que todos temos direto à liberdade de expressão, mas todos somos responsabilizados por eventuais excessos.”
ENTENDA
A empresa divulgou a íntegra da suposta decisão de Moraes, que tramita sob sigilo. Nesta imagem é possível ver que o ministro pediu o bloqueio de perfis que publicaram mensagens “antidemocráticas” ou com teor de ódio contra autoridades. A empresa, no entanto, não teria cumprido as ordens. O magistrado, então, elevou a multa e deu 24 horas para o bloqueio das contas, sob pena de decreto de prisão por desobediência à determinação judicial.
“Apesar de nossos inúmeros recursos ao Supremo Tribunal Federal não terem sido ouvidos, de o público brasileiro não ter sido informado sobre essas ordens e de nossa equipe brasileira não ter responsabilidade ou controle sobre o bloqueio de conteúdo em nossa plataforma, Moraes optou por ameaçar nossa equipe no Brasil em vez de respeitar a lei ou o devido processo legal”, diz o X.
O dono do X, Elon Musk, crítico à atuação do ministro Alexandre de Moraes, compartilhou o comunicado e disse que “ele é uma vergonha total para a justiça”.
“A decisão de fechar o escritório do X no Brasil foi difícil, mas, se tivéssemos concordado com as exigências de censura secreta (ilegal) e entrega de informações privadas do Alexandre de Moraes, não haveria como explicar nossas ações sem ficarmos envergonhados”, escreveu.
DECISÃO
O Poder360 procurou a assessoria do STF por meio de e-mail e mensagens no WhatsApp para confirmar a autenticidade do documento publicado pelo X. Não houve resposta até a publicação desta reportagem. O texto será atualizado caso uma manifestação seja enviada a este jornal digital.
A decisão judicial detalha a tentativa da Secretaria Judiciária de contatar os representantes legais da empresa. O objetivo era fazer com que o X cumprisse a determinação de Moraes de bloquear canais, perfis e contas indicados, fornecer dados cadastrais e cessar sua monetização. A decisão, publicada em 7 de agosto, dava o prazo de 2 horas para que a ordem fosse cumprida, sob pena de multa diária de R$ 50.000.
Na ocasião, a conta oficial do X afirmou que Alexandre de Moraes havia mandado bloquear a conta do senador Marco do Val (Podemos-ES), de Josias Pereira Lima, Ednardo da Vila Mello Raposo, Claudio Rogasane da Luz, Paola da Silva Daniel, Sandra Mara Volf Pedro Eustaquio, Mariana Volf Pedro Eustaquio e de Sergio Fischer.
O oficial de justiça designado informa que tomou conhecimento de que a profissional de relações públicas da empresa designada para o assunto não representava mais o X no Brasil. Uma nova representante jurídica foi indicada, mas houve a recusa de fornecer um contato telefônico, segundo o relato. O oficial relata que tentou contato por e-mail, mas não obteve resposta.
Dada a “desobediência da ordem judicial” da nova representante legal, o ministro Alexandre de Moraes determinou que fosse aplicada multa diária de R$ 20.000 à representante legal, somando a quantia à multa anterior. O magistrado também ordenou a prisão da responsável.
“O teor da certidão elaborada pelo oficial de justiça indica que a representante da empresa X Brasil Internet Ltda., Raquel de Oliveira Villa Nova Conceição, agindo de má-fé, está tentando evitar regular intimação da decisão proferida nos autos, inclusive por meio eletrônicos, da qual já demonstrou ter conhecimento, com o fim de frustrar o seu cumprimento”, escreveu Alexandre de Moraes, na decisão de 6ª feira (16.ago) divulgada pela empresa.