Em entrevista exclusiva à coluna Entrelinhas, o advogado Paulo Faria, que defende o ex-deputado Daniel Silveira, fez críticas ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Faria afirmou ter protocolado um pedido para que o magistrado fosse submetido a uma avaliação psiquiátrica, alegando comportamento explosivo, autoritário e incompatível com a função pública. No documento, o jurista também sugeriu que o ministro use camisa de força. Durante a entrevista, Faria denunciou ainda o que classifica como “estado judicialesco de exceção” e acusa o ministro de violar direitos fundamentais e praticar tortura institucional.
Moraes recusou, na terça-feira (22) o pedido feito pela defesa do ex-deputado federal Daniel Silveira para que ele pudesse deixar temporariamente a prisão no Dia das Mães. No início do mês, Moraes já havia negado um pedido semelhante referente à saída temporária na Páscoa. O advogado de Silveira justificou o pedido afirmando que a mãe dele é idosa, sofre de hipertensão e tem sido afetada emocionalmente por visitar o filho, que, segundo ele, foi condenado de maneira injusta. Silveira está cumprindo pena em regime semiaberto na Colônia Agrícola Marco Aurélio Vergas Tavares de Mattos, localizada em Magé, no Rio de Janeiro. Para o jurista, trata-se de uma vingança pessoal.
Entrelinhas: O senhor protocolou uma petição pedindo o afastamento do ministro Alexandre de Moraes por questão de saúde mental. Quais argumentos o senhor trouxe nesse documento?
Paulo Faria: Foi uma iniciativa minha, como cidadão e advogado, com base no direito de petição previsto no artigo 5º da Constituição. Reuni evidências e condutas públicas do ministro que indicam traços típicos de desvio de personalidade, como ausência de empatia, explosividade e falta de remorso. A literatura médica psiquiátrica trata disso, e a própria Resolução 207 de 2015 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ampara a possibilidade de avaliação de sanidade mental de agentes públicos. Pedi ao presidente do STF que o afaste das funções e promova tratamento adequado. Não fiz isso em nome do Daniel Silveira, mas como advogado e cidadão que observa graves riscos institucionais. Minha preocupação é resguardar o que ainda resta de respeito e dignidade ao STF como instituição.
Esse pedido já teve alguma resposta?
Até agora, nenhuma resposta oficial ao pedido sobre a saúde mental. O que tivemos foi a continuidade de condutas incompatíveis com a função. Recentemente, por exemplo, ele negou ao Daniel o direito de passar o Dia das Mães com a mãe — algo previsto na Lei de Execuções Penais — alegando “má conduta”. Mas essa avaliação cabe ao presídio, não ao ministro. Também pedimos a homologação de 38 dias de remissão de pena por trabalho e leitura, e o ministro simplesmente ignorou o pedido. Isso é mais uma violação da lei.
Há outros casos que o senhor considera abusivos, como entre os presos do 8 de janeiro?
Muitos. O caso da senhora Adalgisa, por exemplo, que está presa preventivamente, sofrendo com depressão profunda e ideação suicida. O ministro tem negado todos os pedidos para conversão da prisão em domiciliar. Isso já foi levado, inclusive, à Corte Interamericana de Direitos Humanos. Espero que não aconteça com ela o mesmo que ocorreu com o Clezão, cuja morte está diretamente ligada à negligência e à crueldade institucional. O ministro Alexandre tem as mãos sujas de sangue nesse caso.
O senhor segue levando o caso Daniel, entre outros, a instâncias internacionais?
Desde o ano passado estamos atuando na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, tanto com o caso do Daniel quanto com o da cidadã americana Flávia Magalhães, que também está sendo perseguida pelo ministro. Em maio, estarei novamente em Washington com uma ONG americana chamada Advocates International, junto a parlamentares e advogados, para denunciar os abusos.
O senhor também menciona estudar um novo pedido de impeachment do ministro. Isso está avançando?
Sim, estou avaliando a apresentação de um pedido de impeachment com base no artigo 39 da Lei 1.079/50, especificamente os incisos 4 e 5. Os atos do ministro, como violação de garantias constitucionais, abuso de autoridade e perseguição política, configuram crime de responsabilidade. Precisamos documentar tudo, mesmo que o pedido não seja acolhido — para que no futuro não se diga que nada foi feito.
O STF tornou réus Filipe Martins, ex-assessor de Jair Bolsonaro, e outros cinco, acusados de suposto golpe. Como o senhor analisou o julgamento deles?
Foi um espetáculo de bizarrices jurídicas. Um julgamento sem precedentes de abusos. Impediram que jornalistas e advogados usassem celulares, restringiram acesso à prova, violaram o artigo 158-A do Código de Processo Penal — a defesa sequer teve acesso aos elementos usados pela acusação. É um processo penal conduzido por militantes de toga. E pior: o próprio ministro Alexandre atua como defensor da acusação, exibindo vídeos surpresa em plenário. Isso não é papel de juiz. É um cenário digno de Orwell, um estado judicialesco de exceção.
O senhor acredita que ainda há espaço para resgatar o papel institucional do STF?
Eu respeito o Supremo Tribunal Federal como instituição, mas não tenho apreço por agentes públicos que se acham deuses e que, na prática, concentram todos os poderes. Juiz não pode ser vítima, acusador e julgador ao mesmo tempo. O que vimos com Daniel Silveira é uma condenação por palavras — palavras que não agradaram os ministros. É o Leviatã, como diria Hobbes, personificado na figura do ministro Alexandre de Moraes. Por isso, sigo atuando dentro da legalidade, buscando responsabilização e medidas corretivas. Ainda há tempo, espero.