Vai ficar mais caro comprar um carro zero no Brasil? Entenda os efeitos da nova tarifa de Trump no mercado automotivo brasileiro


Brasil pode receber o excedente da produção que iria para os EUA, mas preços dos carros não devem ser alterados. O presidente Trump ao lado de um Tesla em frente à Casa Branca
Getty Images via BBC
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A tarifa de importação sobre carros e peças automotivas anunciadas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, na última quarta-feira (26) deve, ter impactos indiretos no Brasil. A expectativa é que a nova taxa entre em vigor em 2 de abril e a arrecadação comece no dia 3 de abril.
Além disso, Trump indicou que também deve aplicar taxas de importação para as autopeças importadas pelo país.
Segundo especialistas consultados pelo g1, a taxa deve afetar o mercado brasileiro de duas formas:
o país deve começar a receber o excedente da produção dos principais exportadores para os EUA, como o México, por exemplo. Isso deve afetar a indústria automotiva por aqui, podendo eventualmente impactar nos preços e nas vendas de produções locais;
a cadeia brasileira de peças automotivas, que é um segmento que exporta uma quantidade significativa de produtos para os norte-americanos, pode sofrer as consequências, caso Trump estenda as taxas de importação a esses produtos.
Entenda esses pontos abaixo:
Mudanças comerciais
Segundo os especialistas consultados pelo g1, o Brasil não exporta carros prontos para os Estados Unidos — o que significa, em outras palavras, que não deve sentir os impactos diretos das tarifas de importação anunciadas por Trump —, mas pode acabar recebendo o excedente da produção dos países que exportam.
“[Em relação às taxas], sentiremos poucos efeitos. A sobretaxa, principalmente para o México, pode fazer com que o excedente de produção tenha outros destinos, como o Brasil. Mas não vejo que isso afetará demasiadamente nosso mercado”, afirma Milad Kalume Neto, consultor independente do setor automotivo.
O Brasil tem um acordo de livre comércio com o México que está em vigor desde 2019 e que permite que os países importem e exportem automóveis e comerciais leves, além de peças, sem cotas e isenções de impostos.
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Nesse sentido, a expectativa é que os impactos não demorem a aparecer. Segundo Neto, os novos produtos e versões lançados no México podem chegar ao Brasil em breve, uma vez que o país precisará desafogar sua alta capacidade produtiva com outros parceiros comerciais.
Mesmo nesse cenário, no entanto, os especialistas ressaltam que o livre comércio deve respeitar um equilíbrio. “A transação com o México tem regras que precisam ser respeitadas, sobretudo quando se fala em contrapartida. Se há capacidade ociosa no México, eles precisarão encontrar outros mercados, além do Brasil, para escoar os produtos”, explica o diretor de estratégia da Bright Consulting, Cassio Pagliarini.
E não é só o México que deve optar pelo Brasil como uma forma de escoar sua produção excedente: outros países também impactados pela nova taxa, como a Coreia do Sul e o Japão, também podem aproveitar o momento para diversificar suas parcerias comerciais.
Para Cagliarini, no entanto, o Brasil deve sentir poucos impactos nos preços, mesmo com a maior oferta de veículos no país.
“Não vejo possibilidade dos carros brasileiros subirem de preço. Só se tivesse um choque grande de demanda, que não é o caso. E os chineses estão desesperados para vender aqui, só que o mercado só cresceu 2,9% até agora”, afirma o executivo, reforçando que esse número era de 12% no mesmo período de 2023.
“Como ainda podemos ter uma enxurrada de carros novos aqui, não vejo motivo para os preços aumentarem”, acrescentou Pagliarini, reforçando que a demanda limitada do país também pode impedir quedas mais bruscas de preços.
Mercado de autopeças
Outro ponto abordado pelos especialistas é o impacto que o mercado de autopeças brasileiro pode sentir caso Trump decida estender as taxas de importação para esse segmento.
Na última quarta-feira (26), o republicano adiou em até um mês a cobrança de autopeças importadas. Em proclamação, Trump determinou que essas peças estarão sujeitas às taxas em uma data a ser especificada em aviso do Registro Federal. Segundo o presidente norte-americano, no entanto, essa data não deve ser posterior a 3 de maio deste ano.
De acordo com os últimos dados disponíveis na plataforma de dados estatísticos Statista, o Brasil exportou um total de US$ 308 milhões (mais de R$ 1,5 bilhão) em peças automotivas para os Estados Unidos em 2023.
O volume total de exportações colocou os EUA como o segundo maior destino das autopeças produzidas no Brasil, atrás apenas da Argentina. Assim, caso as peças também sejam sobretaxadas em 25%, a indústria nacional de peças automotivas sofrerá com a recessão, indicam os especialistas.
“O Brasil é grande exportador de autopeças para o mercado norte-americano. Teríamos uma crise dos fornecedores locais instalados aqui”, alegou Kalume Neto. Segundo o consultor, as consequências para a indústria nacional podem incluir produção ociosa, desemprego e até o fechamento de algumas empresas.
Quem são os principais países afetados pelas novas taxas de Trump?
Segundo dados da S&P Global Mobility, o México é o país que mais envia carros e peças para os EUA, seguido pela Coreia do Sul e Japão. Completando os cinco primeiros estão Alemanha e Canadá. Portanto, esses são os cinco países que mais devem ser impactados pela tarifa de 25% imposta para carros e autopeças anunciada por Donald Trump.
O anúncio não foi bem recebido pelo mercado. Fabricantes norte-americanas, europeias, japonesas e coreanas, como Ford, GM, Volkswagen e Honda, por exemplo, chegaram a apresentar quedas significativas em suas ações após o anúncio.
Segundo especialistas, o cenário é negativo tanto para as indústrias dos Estados Unidos quanto para o restante do mundo. Nos EUA, diz Pagliarini, o primeiro impacto das novas taxas virá na forma de inflação.
“[A tendência é que a nova taxa] aumente o preço dos veículos e das peças importadas, o que deve gerar inflação no país”, diz o executivo.
Kalume Neto, consultor independente, prevê que os preços dos carros com peças importadas ou fabricados fora dos EUA devem aumentar entre 15% e 20% para os consumidores norte-americanos. O cenário, diz o especialista, também pode gerar outros efeitos econômicos que podem levar a uma recessão e afetar outros mercados de forma mais contundente.
A exceção, nesse cenário, seria a Tesla. Isso porque os carros que a companhia vende nos EUA são produzidos localmente — o que lhe permite a vantagem de não sofrer com a taxa importa por Trump. Isso, dizem especialistas, pode mudar a participação de mercado que cada uma das fabricantes têm na região.
“Essas produções locais nos EUA vão sair lucrando e haverá parte da massa de mercado saindo de produtos importados para os locais, o que pode gerar oportunidade de lucro para fabricantes que estejam nos EUA”, finalizou Pagliarini.
Em pronunciamento na véspera, Trump chegou a afirmar que não recebeu conselhos do dono da Tesla, Elon Musk, sobre tarifas automotivas. Segundo ele, as novas taxas anunciadas podem ser “neutras” ou “até mesmo boas” para a fabricante de veículos elétricos. “Ele [Musk] nunca me pediu um favor”, disse o republicano.
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