REGULAMENTAÇÃO DE VIAGEM DO PREFEITO: TRANSPARÊNCIA OU EXCESSO DE CONTROLE?

A recente polêmica envolvendo a viagem do prefeito Alexandre Xepa à Disney, a denúncia de um “vereador” reacendeu o debate sobre a regulamentação das ausências do chefe do Executivo municipal. Em resposta ao caso, o vereador André de Oliveira propôs um projeto de lei para alterar a Lei Orgânica do município, exigindo autorização prévia da Câmara para viagens do prefeito e do vice-prefeito que ultrapassem 15 dias no país ou um único dia no exterior. Além disso, o projeto prevê suspensão ou perda do mandato em caso de descumprimento, salvo em períodos de férias devidamente justificados.

A proposta sugerida pelo Edil levanta uma questão central: até que ponto é legítimo impor tais restrições ao prefeito? A justificativa do vereador baseia-se na transparência e na responsabilidade com a administração pública, mas há um risco de violação da separação dos poderes e da autonomia do Executivo.

A Cidade Ficou Sem Comando?

O argumento de que a cidade ficou desassistida não se sustenta se, de fato, o prefeito transmitiu o cargo ao vice-prefeito, garantindo a continuidade da administração. Se a ausência foi devidamente comunicada e a licença foi não remunerada, não há prejuízo financeiro aos cofres públicos. Dessa forma, exigir aprovação da Câmara para deslocamentos curtos pode ser visto como um controle excessivo sobre o Executivo.

Além disso, a crítica de que o prefeito viajou sem transparência não encontra respaldo nos fatos. A transmissão de cargo foi feita, garantindo que a administração pública seguisse funcionando normalmente. Se houve atraso na publicação oficial do ato, isso não compromete a legalidade da transmissão nem justifica uma punição severa ao chefe do Executivo.

Declarações do Vereador

Durante seu discurso, o vereador André de Oliveira afirmou: “Eu não estou aqui para criticar a viagem de ninguém. O meu problema é com a falta de responsabilidade. Precisamos ter responsabilidade com o dinheiro público e transparência. O prefeito viajou e só após denúncia de um vereador anunciou sua ausência. Eu já acho um absurdo viajar com dois meses e dez dias de mandato, do jeito que a cidade está abandonada, mas, se vai viajar, que haja transparência e hombridade para dizer: ‘Eu tenho um compromisso familiar, vou me ausentar e vou transmitir o cargo ao vice-prefeito’. Porque o cargo foi transmitido hoje a toque de caixa – se é que foi transmitido –, pois não foi publicado no Diário Oficial. E o pior: nós estamos pagando a conta, porque ele não tirou licença não remunerada. Se vai viajar, que vá com o dinheiro dele”, declarou André” (https://www.facebook.com/share/p/15rbQHKQ9n/?mibextid=wwXIfr)

A fala do vereador contém algumas inconsistências:

  • O prefeito de fato transmitiu o cargo, garantindo que a cidade não ficasse sem comando. Questionar a legalidade desse ato sem provas concretas pode ser interpretado como mera retórica política.
  • A viagem foi sem remuneração, ou seja, não houve custo para os cofres públicos. A acusação de que “estamos pagando a conta” simplesmente não procede.
  • A ausência foi de apenas sete dias, dentro de um período razoável para um gestor público, ainda mais considerando que, segundo a Constituição Federal, o Presidente da República pode se ausentar por até 15 dias sem necessidade de autorização legislativa.
  • A publicação no Diário Oficial pode ser uma questão burocrática, mas não invalida a transmissão de cargo. A prefeitura seguiu os trâmites legais, e uma eventual demora administrativa na comunicação oficial não compromete a legitimidade do ato. “Dessa forma, o discurso do vereador parece focado mais em criar um embate político do que em apontar uma real irregularidade na conduta do prefeito”

Neste ponto do “pode ser legal mas é imoral”, também não se sustenta, posto que na academia da escola superior de gestão pública, da Administração e do Direito, o aspecto moral da viagem de prefeito, especialmente no início do mandato e diante de possíveis problemas na cidade, não se sustenta, vista ao cumprimento da legislação pelo Prefeito, no ponto de vista “moral” entende-se que legalmente, não tem sustentação, porém, da licença não remunerada e publicação no diário oficial, se fora ou não comunicada,  pode ser discutido, com fata documentação comprobatória, sob a ótica política e da gestão pública. No entanto, transformar isso em um mecanismo rígido de controle sobre futuras viagens pode criar dificuldades operacionais desnecessárias e abrir margem para disputas políticas que comprometam a governabilidade.

É Constitucional Exigir Autorização para Viagens Curtas?

A Constituição Federal estabelece que o Presidente da República só precisa de autorização do Congresso para ausências superiores a 15 dias (art. 83). Criar uma regra mais rígida para um prefeito pode ser desproporcional e até inconstitucional, pois restringe a liberdade de locomoção do chefe do Executivo municipal sem justificativa razoável.

Além disso, penalidades severas, como suspensão ou perda do mandato, podem ser consideradas abusivas, já que a ausência temporária, por si só, não configura crime de responsabilidade ou infração política grave. O Supremo Tribunal Federal (STF) tem sido claro ao invalidar punições que extrapolam os limites legais e constitucionais.

Tão logo, o Supremo Tribunal Federal (STF) já se manifestou sobre a competência das constituições estaduais em exigir autorização legislativa para viagens de prefeitos. Em um caso envolvendo a Constituição do Estado do Amapá, que exigia licença prévia da Câmara Municipal para qualquer viagem ao exterior, o STF julgou tal exigência inconstitucional, afirmando que apenas ausências superiores a 15 dias poderiam requerer autorização legislativa

Transparência X Excesso de Controle

É inegável que a transparência nas ações do Executivo é essencial. O prefeito tem o dever de informar sua ausência e garantir a continuidade do governo municipal. No entanto, isso não significa que qualquer viagem deva ser submetida à aprovação legislativa. O risco de uma regulamentação excessiva é transformar a governabilidade em um jogo político, onde a Câmara poderia, eventualmente, usar a exigência de autorização para criar embaraços administrativos.

O debate sobre a regulamentação das viagens do prefeito deve equilibrar a necessidade de transparência com o respeito à autonomia do Executivo. Exigir comunicação prévia é razoável, mas impor autorização legislativa para ausências curtas e prever perda de mandato são medidas potencialmente abusivas. O controle do Legislativo sobre o Executivo deve existir, mas dentro dos limites constitucionais, sem comprometer a governabilidade e a eficiência da gestão pública.

Além disso, as declarações do vereador André de Oliveira não se sustentam nos fatos. O prefeito transmitiu o cargo, não recebeu remuneração e se ausentou por um período razoável. A tentativa de transformar essa situação em um escândalo político pode acabar enfraquecendo o próprio discurso da transparência, que deve ser baseado em fatos concretos, e não em conjecturas.  “A proposta tem um alto grau de dificuldade para aprovação e um risco jurídico considerável e significativo. Se o prefeito tiver uma base mínima na Câmara, a oposição dificilmente conseguirá os 9 votos necessários. Além disso, a regra pode ser contestada por ser excessivamente restritiva e interferir na autonomia do Executivo”  

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José Santana

José Santana é jornalista, bacharel em Gestão Pública e pós-graduando em Direito Constitucional e Direito Administrativo pela Universidade Uninter. Atua na análise de políticas públicas, legislação e transparência governamental.

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