MARACUTÁIA: Janja e o lobby da OEI para abocanhar 600 milhões em contratos sem licitação

Nos bastidores de Brasília, atribui-se a injeção inédita de recursos na Organização de Estados Ibero-americanos ao lobby de seu secretário-geral, o espanhol Mariano Jabonero, junto à primeira-dama Rosângela da Silva, que, poucos meses após a posse de Lula, esteve em Madri na sede da OEI. Na ocasião, ela foi convidada para coordenar uma tal Rede Ibero-americana para Inclusão e a Igualdade.

Segundo o site da OEI, a rede teria como missão “mobilizar organizações internacionais, instituições públicas e do terceiro setor, bem como outras redes de cooperação para implementar iniciativas que visem reduzir as desigualdades socioeconômicas que ainda existem na região”.

“Também tem o objetivo de ser uma plataforma de diálogo entre os países ibero-americanos para promover o intercâmbio de boas práticas e soluções conjuntas para problemas como a exclusão social, com foco especial na promoção da educação, cultura, equidade de gênero e igualdade racial”, diz.

Janja se disse “muito honrada em fazer parte da equipe” e comentou que a OEI seria uma “aliada para articular esforços em temas como igualdade de gênero ou digitalização, mas também em outros como o combate à desinformação”. Participaram do encontro Raphael Callou, então diretor da OEI no Brasil, além de outros funcionários espanhóis.

Callou, meses depois, seria rebaixado a diretor de Cultura, para dar lugar a Leonardo Barchini, então secretário-executivo adjunto do Ministério da Educação. Depois de permanecer no comando da OEI por quase um ano, Barchini voltou ao MEC, dessa vez como secretário-executivo, logo abaixo do ministro Camilo Santana.

Barchini, porém, é ligado diretamente a Fernando Haddad. Foi seu chefe de gabinete do MEC, depois o acompanhou na Prefeitura, cuidando das Relações Internacionais e Federativas — onde também se aproximou de Ana Estela Haddad. Integrou a gestão Lula 3 desde o gabinete de transição.

Sua passagem pelo comando da OEI, portanto, só faz sentido no âmbito da parceria estabelecida entre Janja e Jabonero. Seu retorno ao MEC coincide, justamente, com a assinatura sequencial de contratos que já somam quase R$ 600 milhões, um montante inédito que fez a própria organização classificar 2024 com seu ano de “maior projeção”.

Para além de qualquer benefício social derivado dessa aproximação, a relação entre Janja e a OEI parece simbiótica. Jabonero foi quem organizou o evento G20 Social, que reuniu artistas e militantes no Rio de Janeiro e serviu de palanque para a mulher de Lula. Foi de lá que a primeira-dama mandou o “fuck you, Elon Musk”.

“Os eventos paralelos do G20 Social foram uma proposta inovadora da presidência do Brasil no grupo”, garante a OEI.

O Janjapalooza teria custado mais de R$ 80 milhões aos cofres públicos, incluindo patrocínio de Itaipu, bancos públicos e estatais. Muitas despesas estão misturadas com as do evento oficial, o que deixa tudo mais opaco. Da Secretaria Geral da Presidência, sabe-se que a OEI recebeu R$ 16,2 milhões — mais 1 milhão do Ministério da Igualdade Racial.

A falta de transparência lança ainda mais suspeitas sobre o contrato de R$ 478 milhões para organizar a COP-30. O valor, de tão alto, soa como deboche, especialmente depois do discurso de Lula sobre o evento.

“Eu não vou tirar pobre da rua. Eu não vou fazer o que não é possível fazer. Eu quero que eles vejam a nossa Belém como ela é. Se não tiver hotel cinco estrelas, durma no de quatro, se não tiver de quatro, durma no de três, se não tiver de três, durma olhando pro céu.”

Para se ter uma ideia, o montante contratado com a OEI para a COP-30 é equivalente ao que o governo federal acaba de anunciar para o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), destinado ao fortalecimento da agricultura familiar e ao combate à fome. Também é similar ao anunciado em setembro de 2024 para combater incêndios na Amazônia.

Se esse dinheiro não serve ao povo de Belém, servirá a quem? Apenas à autopromoção de Janja? Ressalto que até hoje o governo não indicou os nomes da equipe de coordenação da COP-30, formada por um presidente, um CEO e dois “High Level Champions”, representantes de alto nível.

Desde o ano passado, Janja pressiona Lula para nomeá-la para uma dessas duas vagas ou mesmo criar uma terceira. 

Em fevereiro, Jabonero esteve em Brasília num périplo por ministérios. Reuniu-se com Camilo Santana e também com o presidente do TCU, Vital do Rêgo, que agora é pressionado pela oposição a investigar os contratos da gestão Lula com a OEI. A organização já foi citada em várias apurações do tribunal envolvendo suspeitas de irregularidades, como quarteirização e nepotismo.

No ano passado, o próprio ministro relatou representação que denunciava irregularidades na contratação de consultores para trabalho temporário na Agência Para o Desenvolvimento da Atenção Primária à Saúde (ADAPS).

“A demanda informa sobre o suposto favorecimento nas contratações de amigos íntimos de dirigentes da ADAPS, a presença de casais e parentes na instituição e o direcionamento de admissões”, diz o acórdão, aprovado em agosto de 2024 e que deu prazo de 90 dias para a ADAPS informar sobre as providências tomadas.

Outro episódio virou caso de polícia, com denúncia sobre a atuação de um consultor contratado pelo FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) via OEI para atuar na liberação de recursos para Prefeituras, que, por sua vez, direcionavam parte do dinheiro para uma empresa do mesmo consultor.

Uma característica comum da atuação da OEI é sua contratação via “acordo de cooperação técnica”, burlando mecanismos de concorrência, fiscalização e controle dos recursos públicos. A organização basicamente atua como uma intermediária da administração pública, subcontratando empresas e funcionários que prestarão efetivamente o serviço.

Esse aspecto, inclusive, foi ressaltado na denúncia de Rogério Marinho ao TCU dias atrás.

“Fazendo o cotejo do acordo de cooperação técnica internacional celebrado entre a Casa Civil e a OEI e o Edital de licitação no 11060/2025 – OEI- COP305, que prevê a contratação de 2 (duas) empresas especializadas para o planejamento, a organização e o fornecimento de bens e serviços para execução da 30a Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), conclui-se que houve uma mera delegação da contratação de empresas pela OEI”, afirma.

Para uma organização multilateral criada originalmente para promover “educação, ciência e cultura”, a OEI se assemelha cada vez mais a uma mera ONG que apenas serve a um projeto de poder.

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