SANEAMENTO EM SANTA CATARINA: ATÉ QUANDO A CASAN VAI NOS DEIXAR NA LAMA?

Governantes precisam deixar de pensar que obra enterrada não dá volto e partir para a ação

Por José Santana*

Santa Catarina é um dos estados mais ricos do Brasil, com um PIB per capita acima da média nacional e cidades que lideram rankings de qualidade de vida. No entanto, quando o assunto é saneamento básico, o estado enfrenta um paradoxo vergonhoso:

  • Em 2020, 90,4% da população tinha acesso à água tratada, mas apenas 26,1% contavam com coleta de esgoto.
  • Apenas 31,3% do esgoto gerado no estado era tratado. (Fonte: SNIS – Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento)

Os números evidenciam a deficiência da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan), estatal responsável pelo abastecimento de água e pelo saneamento em diversas cidades do estado. Sua gestão ineficaz compromete a saúde pública, impacta o meio ambiente e dificulta o desenvolvimento sustentável dos municípios.

Apesar da necessidade urgente de mudanças, a Casan segue operando sob um modelo que já se provou ultrapassado e ineficiente. Enquanto algumas cidades buscaram alternativas e avançaram, outras permanecem estagnadas, sujeitas a um serviço precário e à falta de investimentos adequados.

CASAN: UM MODELO DE GESTÃO INEFICAZ

A Casan representa um modelo de administração pública que prioriza a manutenção da estrutura burocrática em detrimento da expansão e da melhoria dos serviços prestados. Dados do Instituto Trata Brasil apontam que Santa Catarina está abaixo da média nacional em saneamento básico, com índices inferiores aos de estados vizinhos.

OS PRINCIPAIS PROBLEMAS DA ESTATAL INCLUEM:

  • Baixa cobertura de esgoto: enquanto cidades como Itapema (76%) e Jaraguá do Sul (71%), avançam com modelos alternativos, a média estadual segue em 26,1%.
  • Desperdício de recursos: o orçamento da empresa é consumido majoritariamente pela manutenção da máquina pública, com poucos investimentos em infraestrutura.
  • Gestão politizada: denúncias de loteamento de cargos e salários acima da média do setor privado são recorrentes.

O resultado é um serviço ineficiente, que coloca em risco a qualidade de vida dos catarinenses e gera impactos negativos na economia do estado.

SANTA CATARINA ESTÁ ATRÁS DOS ESTADOS VIZINHOS

Os dados de saneamento em Santa Catarina são preocupantes, especialmente quando comparados aos dos estados vizinhos:

  • Paraná: 73,7% dos domicílios atendidos por rede de esgoto.
  • Rio Grande do Sul: 71% dos domicílios atendidos.
  • Santa Catarina: apenas 26,1% da população têm acesso à coleta de esgoto.

A defasagem é ainda mais evidente quando se analisa a cobertura média de esgoto por região no Brasil:

  • Sudeste: 80,9% da população atendida.
  • Sul: 49,7% da população atendida.
  • Centro-Oeste: 62,3% da população atendida.
  • Nordeste: 31,4% da população atendida.
  • Norte: 14,7% da população atendida.

Isso demonstra que Santa Catarina está atrasada até mesmo dentro do próprio Sul e abaixo da média nacional, o que evidencia que o problema não é a falta de recursos, mas sim a ineficiência na gestão pública.

PORTO BELO: A PROMESSA DA AUTARQUIA E A REALIDADE FRUSTRANTE

Enquanto algumas cidades avançam com concessões privadas e parcerias público-privadas, outras tentaram uma gestão municipalizada, mas sem o sucesso esperado. Um exemplo disso é Porto Belo, que rompeu recentemente com a Casan e criou uma autarquia municipal para administrar o abastecimento de água e o saneamento básico. A mudança, no entanto, não trouxe avanços significativos.

Porto Belo está entre dois municípios que seguiram caminhos diferentes e conseguiram melhores resultados:

  • Itapema: desde 2004, a cidade adotou uma concessão privada e hoje atende 76% da população com esgotamento sanitário e quase 98% com abastecimento de água.
  • Bombinhas: seguiu a mesma estratégia e apresenta avanços significativos na cobertura de esgoto.

Enquanto isso, Porto Belo segue com índice zero de esgotamento sanitário e dificuldades na distribuição de água, mostrando que apenas mudar o gestor não é suficiente sem planejamento, investimento e eficiência.

EXEMPLOS NACIONAIS DE SUCESSO

Se Santa Catarina precisa de referências para melhorar o saneamento, o Brasil já conta com cidades que conseguiram universalizar o serviço de forma eficiente.

  • Maringá (PR): tem quase 100% de abastecimento de água e mais de 98% de coleta e tratamento de esgoto, graças à parceria com a Sanepar, uma empresa estatal de economia mista que opera com participação privada. O modelo garantiu investimentos contínuos e uma infraestrutura moderna.
  • Limeira (SP): foi uma das primeiras cidades do Brasil a privatizar o saneamento, em 1995. Desde então, os serviços são operados pela BRK Ambiental, que elevou a cobertura de esgoto de 3% para 100% e reduziu drasticamente as perdas de água.

Esses exemplos demonstram que, com uma gestão eficiente e planejamento estratégico, é possível garantir saneamento básico para toda a população.

A QUEM INTERESSA ESSE ATRASO?

A grande questão que precisa ser respondida é: quem se beneficia da manutenção desse modelo ineficiente?

Se há exemplos claros de municípios que romperam com a Casan e avançaram no saneamento, por que ainda há inércia no governo do estado, na Assembleia Legislativa, no Congresso Nacional e no Senado?

Muitos dos representantes eleitos nasceram, cresceram e até governaram cidades sem nenhum tratamento de esgoto, onde a falta de saneamento compromete a saúde pública e o meio ambiente. Como podem permanecer em silêncio diante dessa realidade?

A SOLUÇÃO: CRIAR UM NÚCLEO DE ESTUDOS SOBRE SANEAMENTO

A crise do saneamento básico em Santa Catarina não pode ser tratada de forma isolada. É preciso um plano estratégico, baseado em dados concretos, para reverter esse cenário.

Uma das soluções mais viáveis seria a criação de um Núcleo de Estudos sobre Saneamento, formado por especialistas, gestores e acadêmicos, que teria como objetivo:

  • Diagnosticar com precisão os gargalos do saneamento no estado.
  • Propor soluções eficientes, baseadas em experiências de sucesso.
  • Monitorar a aplicação dos recursos e fiscalizar os contratos de concessão.

Uma iniciativa semelhante já foi implementada em Rondônia, onde um estudo detalhado sobre saneamento gerou impactos positivos no direcionamento das políticas públicas. Por que Santa Catarina não pode seguir o mesmo caminho?

ATÉ QUANDO SANTA CATARINA VAI ACEITAR ESSE RETROCESSO?

Os números são claros. Os exemplos estão disponíveis. O que falta é vontade política para mudar essa realidade.

A sociedade catarinense precisa se mobilizar para cobrar das autoridades uma solução definitiva para o saneamento básico. Enquanto isso não acontecer, o estado continuará refém da lama – e da inércia do poder público.

JOSÉ SANTANA: jornalista, graduado em Gestão Pública e pós-graduando em Direito Constitucional e Direito Administrativo pela Universidade Internacional Uninter. Editor do jornal Folha do Estado 2000/25. Fundador da Ong. Olho Vivo em 2002 e presidente de honra da Entidade. Atua na cobertura de temas políticos, jurídicos e sociais, com foco em transparência, governança e eficiência na gestão pública.

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