Lagoa da Conceição, em Florianópolis, está contaminada com cocaína, aponta pesquisa


Segundo pesquisadora que coordenou estudo, a concentração está entre as mais altas reportadas no mundo. Local é um dos principais pontos turísticos da capital, usado para banho, passeio e pescaria. Lagoa da Conceição, em Florianópolis, está contaminada com cocaína: dados ‘surpreendentes, mas esperados’
Divulgação/PMF
A Lagoa da Conceição, em Florianópolis, está contaminada com cocaína, e em concentrações que estão entre as mais altas reportadas no mundo, segundo pesquisa desenvolvida e divulgada pela Universidade Federal Santa Catarina (UFSC) nesta quinta-feira (13). O resultado impacta na fauna e flora locais (leia abaixo quais são os riscos).
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Além da droga, o estudo encontrou cafeína, diferentes tipos de medicamentos antibióticos e analgésicos. Ao todo, foram 35 “contaminantes emergentes”, nome dado às substâncias de uso diário, como cosméticos e produtos de higiene pessoal que são despejados na água.
⚠️ A Lagoa da Conceição é uma laguna, localizada na região leste da cidade, e é um dos principais pontos turísticos da capital. O local foi palco de um desastre ambiental em 2021, quando uma lagoa artificial de infiltração rompeu.
Professora do departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos da UFSC, Silvani Verruck explica que os índices de cocaína e da benzoilecgonina (principal metabólito da droga) na lagoa são “surpreendentes, mas esperados”, já que as substâncias são liberadas pelos humanos na urina e fezes e foram encontradas em outras pesquisas, como a que encontrou os ilícitos em tubarões da Bacia de Santos. A pesquisa de Santa Catarina usou metodologia semelhante.
“São dados bastante expressivos. Claro, a pesquisa chamou a atenção por causa da cocaína, mas a gente tem um número muito grande de medicamentos, além de outros produtos, inclusive as drogas ilícitas, principalmente a cocaína e outros derivados.”, disse.
➡️ Apesar do estudo não focar em como as substâncias chegaram ao local, a pesquisadora explica que uma possibilidade é o esgoto não tratado, o descarte ilegal direto na água, ou até mesmo de embarcações.
Procurada, a Secretaria do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Capital afirmou que os “resultados refletem os impactos das atividades humanas sobre o meio ambiente” e que adotará providências e diálogo com órgãos responsáveis pelo saneamento e pela preservação do local (íntegra da nota mais abaixo).
Os pesquisadores ainda não divulgaram os números e outros dados quantitativos sobre a droga e os seus derivados, pois organizam outro artigo para publicação com os dados. A expectativa é de que o estudo seja publicado ainda neste ano.
Cafeína e remédios
O estudo mencionou ainda o encontro da cafeína em maior concentração, seguida pela ciprofloxacina, antibiótico utilizado em infecções causadas por bactérias. A clindamicina, outro antibiótico, e o diclofenaco também foram detectados. Para a professora, o encontro dessas substâncias preocupa.
“Nós temos algumas substâncias, os antibióticos, que acabam sendo bastante resistentes. É algo que nos chama a atenção porque muito provavelmente, em algumas concentrações, eles vão sim afetar a flora local, e fauna local, os peixes, siris”, explicou.
Balneabilidade e risco de consumo
Em relação à balneabilidade, a professora explica que os contaminantes emergentes identificados na lagoa pela pesquisa “não são considerados para o estabelecimento da qualidade de banho no locais”. O Instituto do Meio Ambiente (IMA) avalia nove pontos do espaço semanalmente com base na concentração de coliformes fecais.
Na última avaliação, na sexta-feira (7), dois dos nove pontos estavam impróprios para o banho.
Em relação ao consumo, o estudo não mostrou risco do pescado da região. “Então, quanto a isso, o monitoramento contínuo seria o mais importante para seguir avaliando a segurança. Por ora, quanto aos contaminantes avaliados, o consumo humano é seguro”.
Ambientalista em Florianópolis, o também professor da UFSC Paulo Horta explica que na prática, a pesquisa é um indicativo de que o “sistema de saneamento é ineficiente. Além destes contaminantes, temos metais pesados e outro xenobióticos, que fazem mal para a saúde da fauna e flora, e claro faz muito mal para a saúde de banhistas entre outros usuários”.
A reportagem do g1 procurou a Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan), responsável pelo tratamento de água na região e o Instituto do Meio Ambiente (IMA), mas não houve retorno dos órgãos até a última atualização do texto.
Pesquisa
O estudo faz parte do Programa de Recuperação Ambiental proposto pela Casan como forma de compensar as consequências do desastre ambiental provocado após o rompimento da lagoa artificial de infiltração que recebe efluente tratado da Estação de Tratamento de Esgotos da região. Veja outras informações da pesquisa abaixo:
➡️ Início em a partir do início de 2021.
🗺️ Colaboração do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA);
📚 Publicada em 1º de fevereiro de 2025 na revista Science of the Total Environment;
💰 Financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa, Tecnologia e Inovação de SC (Fapesc);
👩‍🔬 🧑‍🔬 Integrantes: Alice Cristina da Silva; Luan Valdemiro Alves de Oliveira; Luan Amaral Alexandre, Mateus Rocha Ribas, Juliana Lemos Dal Pizzol, Gustavo Rocha, Jussara Kasuko Palmeiro, Maurício Perin, Maurício Perin, Rodrigo Hof, Silvani Verruck
Imagens aéreas mostram alagamento na Lagoa da Conceição, em Florianópolis
Corpo de Bombeiros/ Divulgação
Busca por solução
Silvani também trabalhou no estudo que identificou, em 2024, cocaína em grandes animais marinhos, como os tubarões da Bacia de Santos (SP). A pesquisa na Lagoa da Conceição usou metodologia semelhante.
As amostras foram coletadas em pontos estratégicos da Lagoa da Conceição, em Florianópolis, considerando áreas próximas à estação de tratamento de esgoto, às áreas urbanizadas e às regiões de maior biodiversidade.
Como explica Silvani Verruck, o objetivo do estudo é avaliar o impacto ambiental em um espaço bastante urbano e que e apresentar iniciativas para mitigar ou resolver o problema no local. Por isso, em paralelo à análise o grupo desenvolveu e aperfeiçoa uma ferramenta mais eficiente para o tratamento da água .
O equipamento é chamado de “REACQUA”, desenvolvido pela UFSC e usa um sistema de destilação de água a base de luz solar que gera água pura para reuso sem consumo de energia.
“A gente fez alguns testes de remoção [das substâncias encontradas na água contaminada] e consegue ele [sistema REACQUA] consegue ir superbem. Só que claro, é um processo que a gente ainda está otimizando, pois ainda é lento. Agora, a gente quer destilar essa água em maior escala”, explica a professora.
Doutorando Luan Valdemiro Alves de Oliveira, que participou da pesquisa, ao lado do sistema REACQUA
Gustavo Diehl/Agecom/UFSC
O que disse a prefeitura de Florianópolis
A Secretaria do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável informa que tomou conhecimento do estudo realizado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) sobre a presença de contaminantes emergentes na Lagoa da Conceição e irá analisar os dados apresentados. A partir dessa avaliação, serão adotadas as providências cabíveis dentro da competência da Secretaria, em diálogo com os órgãos responsáveis pelo saneamento e pela preservação ambiental.
Os resultados refletem os impactos das atividades humanas sobre o meio ambiente. Reafirmamos nosso compromisso com a qualidade da água e a proteção do ecossistema local, além da importância do monitoramento contínuo e da busca por soluções para minimizar esses efeitos e promover um desenvolvimento mais sustentável.
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