EDITORIAL: DEPORTAÇÃO E DIGNIDADE – UM COMPROMISSO QUE O BRASIL NÃO PODE IGNORAR

“Imigrar, ainda que irregularmente, não é crime e muito menos para serem algemados da cabeça aos pés”

A recente deportação de 158 brasileiros pelos Estados Unidos expõe um problema alarmante que não pode ser aceito por um país que tem a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos de sua República, conforme estabelece o artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988. O transporte de trabalhadores e imigrantes em condições degradantes – algemados dos pés à cabeça e expostos publicamente ao desembarcarem no Brasil – é uma afronta aos direitos fundamentais e uma mancha que exige resposta firme das autoridades brasileiras.

Integrantes da cúpula da Polícia Federal, ouvidos pelo jornal O Globo, afirmaram que a chegada de brasileiros em condições como essas não é usual. No caso específico do voo que pousou em Manaus na última sexta-feira, a aeronave teve que realizar uma parada emergencial na capital amazonense devido a problemas técnicos. O destino final dos passageiros seria o Aeroporto de Confins, em Minas Gerais. No entanto, as imagens registradas em solo brasileiro evidenciam uma violação da dignidade que deve ser apurada e enfrentada pelas autoridades.

Como jornalista com uma formação sólida em Gestão Pública e Pós-Graduando em Direito Administrativo e Direito Constitucional, e com anos de experiência na análise de políticas públicas e na promoção da transparência, me sinto compelido a abordar a questão das deportações de brasileiros pelos Estados Unidos. Esta questão me permitiu observar e analisar as injustiças sociais e a necessidade de um tratamento digno para todos os cidadãos. É imperativo que o Brasil não apenas reconheça seus compromissos internacionais, mas também atue de maneira eficaz para garantir a dignidade de seus cidadãos, independentemente de sua situação migratória.

Imagens recentes de passageiros descendo as escadas do avião em Manaus mostram pessoas acorrentadas e algemadas, com evidente dificuldade de locomoção. Segundo informações divulgadas pela Polícia Federal e pelo Ministério da Justiça, há um acordo bilateral de 2021 entre Brasil e Estados Unidos que veda o uso de algemas ou correntes, salvo em casos que representem risco à segurança de passageiros e tripulação. Ainda assim, em 2024, 2.557 brasileiros foram deportados pelos EUA, de acordo com dados do governo Lula, e esse tipo de situação não poderia mais ser tolerado.

Imigrar, ainda que irregularmente, não é crime. A deportação é um procedimento administrativo que, em nenhum momento, autoriza o uso de medidas que tratem indivíduos como criminosos ou coloquem sua dignidade em risco. O tratamento desumano dispensado a brasileiros em processos de deportação, com imagens chocantes de homens e mulheres algemados sendo exibidas em solo nacional, fere tanto o artigo 5º, inciso III, que proíbe tortura e tratamentos degradantes, quanto o artigo 5º, inciso X, que protege a privacidade e a imagem das pessoas.

Além disso, o Brasil é signatário de tratados internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos e o Pacto de San José da Costa Rica, que reforçam a obrigação de respeito à integridade moral e física, independentemente da situação migratória. O silêncio diante dessas violações é inadmissível, pois normaliza a humilhação e o sofrimento de cidadãos que buscam melhores oportunidades em outros países, muitas vezes devido à falta de condições dignas em seu próprio território.

O governo brasileiro, por meio de suas embaixadas e consulados, tem o dever de:

  1. Fiscalizar o tratamento dado a seus cidadãos no exterior, exigindo que sejam respeitados os direitos humanos.
  2. Registrar queixas e pedir explicações formais, caso existam denúncias de abusos.
  3. Garantir apoio jurídico e consular aos cidadãos deportados, assegurando que seus direitos sejam respeitados.
  4. Proteger a imagem pública dos deportados em território nacional, evitando que a chegada em condições humilhantes perpetue o estigma.

É preciso lembrar que o artigo 4º da Constituição determina que o Brasil conduza suas relações internacionais com base na prevalência dos direitos humanos. Ademais, a Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017) estabelece princípios de respeito à dignidade da pessoa humana, à proteção dos direitos fundamentais dos migrantes e ao não uso de práticas que desumanizem os cidadãos, reforçando a responsabilidade do Estado em garantir um tratamento digno e respeitoso a todos.

Ademais, é imperativo que o governo brasileiro busque uma revisão da aplicação do acordo de 2021, garantindo que ele seja respeitado em sua totalidade, para que nenhum cidadão seja deportado em massa sem uma decisão transitada em julgado por uma corte de justiça. O Brasil também deve assumir um papel ativo no processo de repatriação, disponibilizando aeronaves próprias para trazer de volta os brasileiros deportados em condições dignas, evitando que cenas degradantes continuem a ocorrer.

É importante observar que outros países adotam práticas respeitosas em relação a refugiados e imigrantes. Por exemplo, países como Canadá, Alemanha e Suécia são reconhecidos por seus programas de acolhimento que priorizam a dignidade e os direitos humanos, oferecendo apoio jurídico, acesso a serviços de saúde e integração social.

O compromisso do Brasil com a dignidade humana deve ser inegociável. Mais do que uma questão de relações diplomáticas, essa é uma exigência ética e constitucional. Tratar com respeito aqueles que retornam ao país, independentemente das circunstâncias, é um reflexo do valor que atribuímos à vida e aos direitos de todos os brasileiros. O governo deve agir com firmeza para que situações como esta não se repitam, demonstrando que o Brasil não tolerará abusos contra seus cidadãos.

Da Redação: Folha do Estado SC

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