CONTOII – O MAR, O CORPO E A AMBIÇÃO

Mais uma história emocionante contada pelo Dr. Virgílio

Quando Manuel tinha dezesseis anos, ele era apenas um rapaz com sonhos grandes e um coração leve, como o vento que cortava as águas frias do Atlântico. Ele vivia em uma pequena vila na costa da Galícia, onde o mar tocava cada pedaço da vida. Todos conheciam o velho barco de Manuel, um simples bote de pesca que ele remava sozinho pela manhã, buscando o que o mar oferecia.

Foi em uma dessas manhãs que ele a viu pela primeira vez. Isabella. Ela estava sentada à beira da praia, com os pés descalços na areia, seus cabelos negros balançando com a brisa. Quando seus olhares se cruzaram, algo mudou dentro dele. Ele sentiu uma leveza, uma pureza de sentimentos que ele nunca soubera que existia. A jovem era tudo o que ele sonhara e mais: era como uma tempestade calma que fazia o mundo parar.

Eles se aproximaram, e Manuel, com sua timidez, falou pouco, mas o suficiente para capturar a atenção dela. Ela tinha o sorriso mais sincero que ele já vira, e o toque de suas mãos parecia curar qualquer dor. Juntos, compartilharam tardes longas no porto, conversando sobre as pequenas coisas da vida, enquanto o mar sussurrava segredos antigos.

Naqueles dias, Manuel conheceu o amor – não o amor trivial, mas aquele amor que acende todos os sentidos, que transforma o vento em perfume e o sol em calor na alma. O corpo de Isabella o fazia sentir o que ele nunca soubera que existia: uma explosão silenciosa de felicidade. Ela o despertava para o mundo, e ele sentia que ali, naquele amor puro, tudo que precisava estava bem diante dele.

Mas a vida é traiçoeira, e o tempo, implacável. Aos dezoito anos, o fogo da ambição começou a queimar em seu peito. Ele queria ser mais. Queria ser grande, rico, importante. A pesca, que antes era sua paixão, já não bastava. O mar, tão vasto e infinito, parecia agora pequeno, como se o mundo fosse maior do que as águas que ele sempre conhecera.

Ele deixou Isabella, disse-lhe que precisava ir embora, que tinha sonhos grandes demais para viver à sombra da pequena vila. Ela o olhou, os olhos cheios de tristeza, mas não disse uma palavra. Ela sabia o que estava acontecendo. Ele estava indo atrás de uma fama que não teria substância, de um poder que não o completaria.

Os anos passaram, e Manuel se tornou um homem de sucesso. Sua pesca foi substituída por negócios prósperos, sua vida, por festas e aplausos. Ele se tornou alguém. Mas o que ele havia conquistado não preenchia o vazio dentro de si. Ele ganhava o mundo, mas perdia a alma. A fama, o dinheiro, as viagens, tudo parecia sem sabor. Ele estava, na verdade, se afogando nas coisas que pensava desejar.

Com a velhice, a força começou a se esvair, e Manuel sentiu, pela primeira vez, o peso de sua escolha. Ele estava rodeado de riqueza, mas sozinho. A juventude se fora, e com ela, o brilho nos olhos que ele tivera um dia. Ele lembrou-se de Isabella. Lembrou-se de como ela o havia feito sentir-se vivo, e agora, envelhecido e cansado, ele percebeu que o amor que ela lhe dera tinha sido o único que realmente importava. Mas já era tarde.

Na solidão do fim de sua vida, Manuel olhava para o mar, que parecia agora mais distante do que nunca. Ele havia se perdido em sua busca por coisas vazias, e o que restara era a saudade de algo puro. Ele fechava os olhos e via o sorriso de Isabella, sentindo, pela última vez, a ternura de um amor que não soubera valorizar. A areia entre seus dedos escorria, a água batia suave contra o cais, e a vida, finalmente, o consumia.

Tudo o que ele havia conquistado dissolvia-se lentamente, como a água do mar levando a areia. E Manuel, agora fraco e sem forças, entendia o que sempre soubera, mas nunca quis aceitar: o verdadeiro poder da vida não estava na fama ou no sucesso. Estava na pureza de um amor perdido, que o tempo jamais devolveria.

Por Virgilio Galvão – Brasília

 

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