EDITORIAL: A EXONERAÇÃO DE AGENTES PÚBLICOS E SEU IMPACTO NA DEMOCRACIA: O QUE ESTÁ EM JOGO?

Cada macaco no seu galho, senão a árvore não aguenta…

Em um evento promovido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para marcar os dois anos dos ataques às sedes dos Três Poderes em Brasília, o ministro Alexandre de Moraes defendeu a necessidade de regulamentar a participação de militares, policiais, membros do Ministério Público e da magistratura em cargos do Legislativo e Executivo. Ele argumentou que a ausência de regras claras pode comprometer a imparcialidade e a independência dessas instituições, que são fundamentais para a democracia brasileira. Moraes destacou que “a regulamentação da participação de militares, policiais, membros do Ministério Público e da magistratura em cargos políticos é fundamental para garantir a independência das instituições e a integridade do Estado democrático.”

A REALIDADE ELEITORAL NO BRASIL

Nas eleições municipais de 2024, o Brasil registrou um aumento significativo ao eleger policiais e militares para cargos públicos. Foram eleitos 759 agentes para o cargo de vereador, 52 prefeitos e 45 vice-prefeitos, totalizando 856 profissionais oriundos das forças de segurança pública, ocupando posições no Executivo e nos Legislativos municipais.

Já nas eleições gerais de 2022, houve um aumento de 35% no número de policiais e militares eleitos para a Câmara dos Deputados em comparação com o pleito anterior.

Esses números refletem uma tendência crescente de participação de profissionais das forças de segurança na política brasileira, o que tem gerado debates sobre a necessidade de regulamentação para evitar conflitos de interesse e assegurar a imparcialidade das instituições. O filósofo Vladimir Safatle observa que “a política deve ser um espaço de reflexão crítica, e não uma extensão das estruturas de poder que já existem. A presença de profissionais da segurança pública em cargos eletivos deve ser acompanhada de uma discussão sobre a ética e a responsabilidade.”

CONSEQUÊNCIAS DA EXONERAÇÃO DE SERVIDORES PÚBLICOS

A exoneração de servidores públicos, como policiais, magistrados e membros do Ministério Público, para assumir cargos eletivos, compromete a qualidade dos serviços públicos no Brasil. Essa saída em massa resulta em vacâncias que prejudicam a liderança e a continuidade de serviços essenciais, enquanto a perda de experiência técnica dificulta a formulação de políticas eficazes. Além disso, a possibilidade de conflitos de interesse e a instabilidade institucional minam a confiança da população nas instituições democráticas. Portanto, a regulamentação da participação desses profissionais na política não apenas se faz necessária, mas é urgente para garantir que as funções críticas do Estado não sejam prejudicadas por interesses político-partidários. O sociólogo Zygmunt Bauman nos lembra que “em tempos de incerteza, a confiança nas instituições democráticas é o que nos mantém unidos. A participação de agentes do Estado na política não pode comprometer a imparcialidade e a confiança do cidadão.”

A URGENTE NECESSIDADE DE REGULAMENTAÇÃO

A recente prisão do ex-ministro da Defesa, Walter Braga Netto, em 14 de dezembro de 2024, evidencia as sérias implicações da falta de uma lei que regule a participação de militares, membros do Ministério Público e magistrados em cargos eletivos. Braga Netto foi acusado de envolvimento em um plano de golpe de Estado para impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e sua detenção, autorizada pelo ministro do STF, Alexandre de Moraes, destaca a necessidade urgente de se discutir a ética e a moralidade na utilização de cargos públicos como trampolins políticos.

A falta de regulamentação pode levar a:

  1. Comprometimento da imparcialidade nas instituições.
  2. Conflitos de interesse em detrimento das funções públicas.
  3. Descontinuidade na prestação de serviços essenciais.
  4. Transformação de instituições em palanques eleitorais.

Exemplos notáveis de figuras que transitaram de altos cargos públicos para a política incluem Sérgio Moro, Deltan Dallagnol, Flávio Dino, Hamilton Mourão, Eduardo Pazuello, Augusto Heleno, Carlos Alberto dos Santos Cruz e o ex-juiz Wilson Witzel, cassado após ser acusado de corrupção. Esses casos demonstram a urgência de um debate ético e legal sobre essa prática.

UMA SOLUÇÃO PARA FORTALECER A DEMOCRACIA

A regulamentação não deve ser vista como uma restrição, mas como um mecanismo para proteger a democracia e fortalecer a confiança nas instituições. A criação de prazos de desincompatibilização claros e de programas de formação para candidatos egressos dessas carreiras pode garantir que a transição seja ética e equilibrada.

Além disso, cabe aos partidos políticos promoverem candidaturas baseadas na qualificação técnica e na ética, ao invés de explorarem a popularidade ou a influência prévia de seus candidatos. O sistema eleitoral deve ser um campo de oportunidades iguais, e não um jogo de vantagens desleais.

O CHAMADO À AÇÃO

O Brasil precisa de regras que conciliem a proteção das instituições com a ampliação da representatividade política. Cabe ao Congresso, à sociedade e às próprias instituições públicas conduzirem esse debate com urgência e transparência.

A política não deve ser um campo de privilégios para quem já exerce poder, mas um espaço democrático que respeite tanto a igualdade de oportunidades quanto a integridade institucional. Como bem coloca José Santana, jornalista, graduado em Gestão Pública, pós-graduando em Direito Administrativo e Direito Constitucional: “A falta de uma legislação adequada sobre a participação de servidores públicos na política mina a ética e a confiança nas instituições democráticas.” Esse é o desafio – e a oportunidade – de nossa democracia em evolução.

Folha do Estado SC

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