EDITORIAL: FERNANDA TORRES E A VITÓRIA NO GLOBO DE OURO

A arte como memória e a desinformação como obstáculo

A vitória de Fernanda Torres na premiação do Globo de Ouro, na categoria “Melhor Atriz em Filme de Drama”, é um marco para o cinema brasileiro. Sua atuação no filme ‘Ainda Estou Aqui’, dirigido por Walter Salles, emocionou o mundo ao abordar, com profundidade e humanidade, um dos períodos mais sombrios da história do Brasil: a Ditadura Militar. Como bem afirmou Walter Salles, “o cinema tem um papel fundamental na construção da memória e na reflexão sobre o que vivemos como sociedade”. Mas, apesar do reconhecimento internacional, aqui pelo Brasil acusações infundadas surgiram, afirmando que o filme teria sido financiado pela Lei Rouanet e que o prêmio seria fruto de manobras da Rede Globo. Essas alegações  dos direitistas fanáticos não apenas desconsideram os fatos, mas também desrespeitam o significado e o impacto cultural da obra.

O filme ‘Ainda Estou Aqui’ é baseado na autobiografia de Marcelo Rubens Paiva e narra a história de Eunice Paiva, vivida brilhantemente por Fernanda Torres. Eunice foi uma mulher que enfrentou o desaparecimento de seu marido, Rubens Paiva, um deputado federal, cassado pelo regime militar, que foi preso, torturado e morto em 1971. O longa explora o impacto devastador do desaparecimento forçado na vida da família Paiva, retratando o luto, a luta por justiça e a resistência contra um sistema que silenciava seus opositores. Como destacou Fernanda Torres, “Eunice é um símbolo de resistência, e sua história é uma convocação à luta pelos direitos humanos”.

A obra não apenas relembra os crimes da ditadura como os assassinatos e os desaparecimentos de opositores políticos, mas também resgata a força de pessoas como Eunice, que, mesmo diante da tragédia pessoal, se tornou uma defensora incansável dos direitos humanos. O filme é um tributo à memória histórica e uma denúncia contra as injustiças de um passado sombrio que ainda ecoa na sociedade brasileira, com alguns grupos reivindicando o retorno da ditadura.

A DESINFORMAÇÃO E OS ATAQUES

Apesar do sucesso e da importância histórica do filme, acusações de que ele teria sido financiado pela Lei Rouanet e que o prêmio teria sido manipulado pela Rede Globo começaram a circular nas redes sociais. Tais afirmações são completamente falsas. Desde 2007, a Lei Rouanet proíbe o uso de recursos para longas-metragens de ficção, e Ainda Estou Aqui foi financiado por parcerias privadas, incluindo o Globoplay e a Conspiração Filmes.

Quanto ao Globo de Ouro, ele é organizado pela Hollywood Foreign Press Association (HFPA), uma entidade independente dos Estados Unidos. A premiação reflete o reconhecimento global do talento de Fernanda Torres e da qualidade da produção, sem qualquer interferência de emissoras brasileiras.

A IMPORTÂNCIA DE RESGATAR A MEMÓRIA

O filme de Walter Salles cumpre um papel essencial ao trazer à tona um capítulo sombrio da história brasileira que muitos preferem ignorar. A ditadura militar foi marcada por censura, tortura e desaparecimentos forçados, como o de Rubens Paiva. Essa memória é fundamental para que os erros do passado não sejam repetidos. Como disse Marcelo Rubens Paiva, “a memória é um ato de justiça, e é nossa responsabilidade manter vivo o legado de quem lutou pela liberdade”. Obras como Ainda Estou Aqui nos convidam a refletir sobre a necessidade de justiça e sobre os valores democráticos que devem guiar nossa sociedade.

CELEBRAR A CONQUISTA, PRESERVAR A MEMÓRIA E DEFENDER A DEMOCRACIA

A vitória de Fernanda Torres no Globo de Ouro não é apenas um reconhecimento individual, mas um marco para a cultura brasileira. Ela demonstra que o cinema nacional, quando comprometido com a verdade histórica e com a arte de qualidade, tem o poder de alcançar o mundo. Mais do que uma celebração, essa conquista é um convite à reflexão. Ao abordar um período tão sombrio quanto a ditadura militar, o filme Ainda Estou Aqui nos lembra que a preservação da história e da memória é essencial para que os erros do passado não sejam repetidos. É por meio da arte e da cultura que mantemos vivas as vozes daqueles que lutaram por justiça, liberdade e dignidade.

Além disso, essa premiação reforça o papel da cultura na consolidação da democracia. Obras como essa não apenas entretêm, mas educam e provocam, contribuindo para o fortalecimento de valores democráticos e para a construção de uma sociedade mais justa e consciente.

REFERÊNCIAS:

  1. PAIVA, Marcelo Rubens. Feliz Ano Velho. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
  2. SALLES, Walter. Entrevistas e artigos disponíveis em veículos como Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo.
  3. TORRES, Fernanda. Entrevistas sobre seu papel e a relevância da luta pelos direitos humanos.
  4. Críticas de cinema em sites como Adoro Cinema e Rotten Tomatoes.
  5. Estudos acadêmicos sobre a ditadura e direitos humanos, publicados em revistas científicas.
  6. Relatórios da Comissão da Verdade. Documentos que investigam os crimes da ditadura militar.
  7. Institutos de pesquisa sobre cinema e ditadura, com publicações que analisam a cultura e a memória.

Que esta vitória seja uma inspiração para todos os artistas brasileiros e um chamado para que valorizemos e defendamos a cultura como um dos pilares da memória, da identidade e da democracia.

Folha do Estado SC

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