André Bonomini: O dia do “rancho” no Pfuetzenreiter

Perdermos Arthur Pfuetzenreiter. E eu imagino que puxar esse sobrenome rebuscado (e que espero ter acertado finalmente) não necessariamente seja sinônimo de excelência empresarial, mesmo ele o sendo fortemente. Tem algo mais.

No cerne do nome, a história colocou-o num lugar pioneiro, em tempos onde o processo de compra de gêneros saía detrás dos balcões dos antigos “secos-e-molhados” para ganhar um patamar de massa: gigante, prático, multifunção e quase industrial, elemento que ainda segue modificando-se nestes dias de conectividade e virtualidade que vivemos.

Foto: Arquivo Pessoal

De outro, faz o saudoso pegar um velho carrinho e, munido de uma lista quilométrica, fazer o “rancho”, entre marcas e sensações de outros tempos, driblando filas cheias, a birra da criança chorando pelo brinquedo e trazendo do carro o engradado pesado de vasilhames para ser trocado por garrafas de refrigerante e cerveja cheias outra vez.

Arthur Pfuetzenreiter, filho do pioneiro Rudolfo, teve tino e perspicácia para perceber o movimento que o varejo fazia em fins dos anos 1960 e apontar ao pai o rumo a se tomar. Saíram da pequena “venda” onde originou-se a vida comercial da família nos anos 1940 para investir no que já era um modelo consolidado e dado como certo.

Nos grandes centros, SirvaSe e Jumbo eram exemplos, o mercado acanhado precisava acrescentar um “super” na definição, quando muito um “hiper” na necessidade. Aqui, o modelo que tinha Carlos Koffke e o próprio Rudolfo Pfuetzenreiter como embriões pedia mais. Blumenau já não era uma cidade pequena onde o misto de balcão e prateleira funcionavam neste tipo de varejo.

Interior da Com. Rudolfo Pfuetzenreiter na Rua 7 (térreo do Hotel Gloria). O modelo balcão-prateleira já não servia mais para Blumenau, e Arthur apontou o caminho: supermercado (Foto: Arquivo Histórico)

Até hoje, para mim ou para qualquer blumenauense da gema que viveu parte deste momento, atravessar a Rua 7 e deixar a memória regressar sozinha no tempo do velho supermercado ao lado do Neumarkt é quase um processo padrão e certeiro. Eu vivi ainda a “fase Pão de Açucar” daquele salão gigante hoje ocupado por boliche e loja de descontos.

Mas você da gema, sabe ou já ouviu a exaustão os antigos falando corriqueiramente: “precisamos ir no Pfuetzenreiter!” A força da referencia criada, você já sabia onde ir mesmo que, as vezes, perguntava aonde era este tal lugar se não o supermercado que mostrava as ofertas na TV.

O sobrenome rebuscado soava complicado mas era dito com a facilidade de dizer “supermercado” a qualquer blumenauense. A grande loja surgiu como âncora de uma rede que tomaria localidades do município e cidades como Florianópolis e Balneário Camboriú ainda nos anos 1970, consolidando aquele mesmo sobrenome como um carro-chefe entre tantas redes supermercadistas que prosperavam no estado ainda jovem e pouco descoberto.

A inauguração da moderna loja na Rua 7 mereceu “nota 10” na avaliação do A Nação, em novembro de 1970 (Foto: Família Pfuetzenreiter)
Artur (ao centro, de óculos) inaugurando a filial de Balneário Camboriu, na Av. Brasil (Foto: Família Pfuetzenreiter)

Arthur era também um dos nomes na diretoria da recém-fundada ACATS (Associação Catarinense de Supermercados), que congregava alguns outros nomes e sobrenomes famosos naqueles tempos de exploração do novo ramo. Era a reunião de legendas que, assim como Pfuetzenreiter, eram a referencia das regiões que vinham e que também pensavam fora da caixa como ele: Angeloni, Giassi, Vitória, Breithaupt, Archer, Comper, Nardelli e outros pioneiros.

A empreitada, de tão forte na comunidade, sobreviveu até mesmo a um incêndio na principal loja, tomando de susto a família e clientes nos primeiros dias de 1980 e já sob o controle da grande marca dos Diniz. Mas a força do nome Pfuetzenreiter já tinha enraizado o suficiente para tornar saltos necessários e crises como esta em passos a ser dados.

Uma nova casa surgiu do escombros, talvez com a pompa mais justa e a face mais ligada a cidade do que antes. Esta talvez seja a que mais ligue as minhas memórias. Não um Pfuetzenreiter autêntico, com o ar dos anos 1970, mas algo que chegava perto daqueles outros momentos do passado num supermercado. Grande, movimentado, preços e promoções, lanchonete interna e, claro, os mesmos choros de crianças com desejos não realizados.

O incêndio no Supermercado Pfuetzenreiter, no início de 1980. Prédio ficou irrecuperável. Abaixo, a nova loja, em tempos onde o Pão de Açucar já controlava a rede em SC (Foto: Antigamente em Blumenau)

O tempo passou depressa. Vieram as remarcações constantes das crises econômicas, outras mil mudanças no perfil e preferencia dos clientes e até mesmo concorrentes de ramo que resolveram fazer frente ao sobrenome. O “rancho” deixou de ser um só para ser fragmentado em paradas quando necessário e o Pão de Açucar, sinônimo de supermercado à época foi-se embora, bem como o sucedâneo Vitória/Mini Preço em fase final.

Mas acredite, Pfuetzenreiter ainda é um nome que circula nas memórias de muita gente que ainda recorda com detalhes os “ranchos” passados. Das antigas lojas da rede na cidade, duas delas ainda são utilizadas como supermercados (Cooper na Itoupava Norte e Carol no Garcia) e os livros, infelizmente, tem muito pouco de fotos e imagens comparado aos que correram os corredores daqueles idos maravilhados com o admirável mundo novo de um supermercado de fato.

A filial na Itoupava Norte, atualmente localização da Cooper no bairro (Foto: Família Pfuetzenreiter)

Esta obra não sairá das mãos da numerosa familia Pfuetzenreiter, e principalmente de Arthur, que apontou um caminho, o seguiu e prosperou. E enquanto a empresa que levava o nome da família tornava-se referencia o blumenauense anotava num papel a toa as compras que faria no sábado de manhã, com a família reunida para visitar o supermercado, tal como turismo.

Marcas e nomes que não saem da memória de uma cidade que cresce e, as vezes, esquece de referenciais e monumentos, como o hoje combalido prédio na Rua 7. No entanto, se um mais experiente lhe dirigir a palavra para ir ao supermercado, não estranhe…

Ele precisa “ir ao Pfuetzenreiter”. Vá!

Ofertas no Pfuetzenreiter em uma semana de 1980 (Foto: JSC / Arquivo Histórico)

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