BANCOS ORIENTAM CLIENTES A REGISTRAR BOLETIM DE OCORRÊNCIA SEM RESPALDO LEGAL

O que fazer em casos de fraudes nas suas contas bancárias?

No Brasil, muitos correntistas de bancos e usuários de cartões de crédito são vítimas de fraudes e golpes, sofrendo prejuízos financeiros significativos. Em casos de contas saqueadas indevidamente ou cartões clonados, os bancos costumam instruir seus clientes a registrar um boletim de ocorrência (BO) em delegacias de polícia. No entanto, essa exigência não possui respaldo legal para a solução do problema e pode gerar mais burocracia sem garantir o ressarcimento ao consumidor.

FRAUDES BANCÁRIAS EM ALTA NO BRASIL

Os crimes contra clientes bancários seguem aumentando. Entre julho de 2022 e agosto de 2023, cerca de 7,2 milhões de consumidores foram vítimas de fraudes financeiras, segundo a Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL). No primeiro semestre de 2024, as tentativas de fraude com cartões de crédito no e-commerce somaram R$ 1,2 bilhão, conforme levantamento da ClearSale. O mês de fevereiro foi o mais crítico, com 177,6 mil ocorrências e um ticket médio de R$ 1.066 por golpe.

Diante desse cenário, é fundamental que as instituições financeiras adotem medidas eficazes de segurança e assumam sua responsabilidade legal perante os consumidores prejudicados.

RESPONSABILIDADE DO BANCO PELO PREJUÍZO

A relação entre cliente e banco é regida pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990), configurando-se como uma relação de consumo. Isso significa que os bancos têm responsabilidade objetiva pelos danos causados aos clientes, conforme estabelece o artigo 14 do CDC:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Além disso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já consolidou o entendimento de que os bancos são responsáveis por fraudes e golpes aplicados contra seus clientes, salvo se conseguirem comprovar que não houve falha na prestação do serviço. A Súmula 479 do STJ reforça essa posição:

Súmula 479: As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.

Portanto, quando um cliente sofre prejuízo por fraude bancária, o banco deve ressarcir os valores indevidamente subtraídos, salvo se demonstrar que o golpe ocorreu exclusivamente por culpa do próprio consumidor.

PROCEDIMENTOS CORRETOS PARA O CLIENTE

Diante de uma fraude bancária, o consumidor deve adotar as seguintes medidas:

  1. Registrar uma ocorrência administrativa no banco, exigindo a análise do caso e o reembolso dos valores.
  2. Acionar o Banco Central, por meio da plataforma de reclamações do órgão, relatando a falha da instituição financeira.
  3. Procurar o Procon ou outro órgão de defesa do consumidor para formalizar uma queixa.
  4. Entrar com uma ação judicial, caso o banco se recuse a ressarcir os valores, podendo pleitear também indenização por danos morais.

Caso o banco insista na exigência do boletim de ocorrência, o mais adequado seria registrar o B.O. contra o próprio banco, responsabilizando-o pela falha na segurança e na prestação do serviço.

O PAPEL DO BANCO CENTRAL

Apesar de muitos bancos alegarem que seguem orientações do Banco Central, não há uma norma específica do Bacen que obrigue os clientes a registrarem boletins de ocorrência em casos de fraudes. Essa exigência geralmente parte das próprias instituições financeiras como parte de seus procedimentos internos.

O que o Banco Central determina são diretrizes para que as instituições adotem medidas de segurança eficazes na prevenção de fraudes. No entanto, como já demonstrado, a responsabilidade pelo ressarcimento dos clientes está estabelecida no Código de Defesa do Consumidor e na jurisprudência do STJ.

CONCLUSÃO

Embora o boletim de ocorrência possa ser útil para investigações policiais, ele não substitui a obrigação legal do banco de resolver o problema diretamente com o cliente. O consumidor lesado deve buscar seus direitos com base no Código de Defesa do Consumidor e, se necessário, acionar os órgãos competentes para garantir o ressarcimento dos valores indevidamente retirados.

A orientação de registrar um B.O. não pode ser usada como barreira burocrática para dificultar ou postergar o reembolso ao cliente. Os bancos devem aprimorar seus sistemas de segurança e assumir a responsabilidade legal diante dos prejuízos causados por fraudes bancárias.

JOSÉ SANTANA: Jornalista, graduado em Gestão Pública e pós-graduando em Direito Constitucional e Direito Administrativo pela Universidade Uninter. Responsável pelo portal Folha do Estado SC, com 25 anos de atuação no jornalismo investigativo, especializado em matérias técnicas, editoriais e artigos analíticos. Fundador e presidente de honra do entidade Olho Vivo, organização voltada à fiscalização e transparência na gestão pública. Possui ampla experiência na cobertura de temas jurídicos, políticos e econômicos, além de atuar na produção de conteúdos estratégicos voltados à análise legislativa e ao combate à corrupção.

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