Estudo defende que não há hiper tributação de pobres no Brasil

Um estudo realizado por um grupo de pesquisadores defende que não há “hiper tributação” de pobres no Brasil. Segundo as conclusões do levantamento, é errado dizer que, proporcionalmente, as famílias de renda mais baixa pagam mais impostos sobre os bens consumidos que os mais ricos.

Vai contra o argumento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do ministro Fernando Haddad (Fazenda), que defendem ser necessário “onerar quem não paga imposto”, em referência aos mais ricos.

O estudo “O mito da hiper tributação dos pobres no Brasil” foi publicado no domingo (5.jan.2025) por João Kleber Lima, Paulo Domingos Matos, Erik Figueiredo e Marcos Köhler. Leia a íntegra do documento (PDF – 294 kB).

Os pesquisadores usam como base de análise um estudo de 2022, de Fernando Gaiger Silveira: “Tributação indireta: alíquotas efetivas e incidência sobre as famílias”. No levantamento realizado há mais de 2 anos, o autor afirma que a alíquota efetiva da população mais pobre é de 23,4%. Já a pesquisa mais recente indicou que a carga tributária indireta seria de 3,7%, ou 19,7 pontos percentuais a menos.

O motivo: os novos estudos divulgados em 2024 consideram a educação, transporte público, conta de luz e outros subsídios públicos no cálculo. Os pesquisadores defendem que parte expressiva da população brasileira recebe uma série de subsídios ou provimento gratuito de bens e serviços, o que faz a alíquota efetiva dos bens consumidos “bem pequena”.

A carga tributária incidente sobre os estratos mais baixos de renda é significativamente inferior àquela aplicada aos estratos mais elevados, refutando, assim, a tese de hiper tributação dos mais pobres”, afirma o estudo.

10 FAIXAS DE RENDA

O estudo dividiu as famílias brasileiras em 10 faixas de renda diferentes, chamadas de “decil”. Com base em dados da POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares) de 2017-2018, elaborou um quadro com o pesos orçamentários de renda média. Os gastos com energia elétrica, gás de cozinha, água e esgoto têm trajetórias decrescentes conforme se avança as faixas de renda.

Por outro lado, despesas com saúde, educação e transporte não têm tendência clara, variando conforme a faixa de renda.

“Entre os 10% da população com menores rendimentos, verifica-se que, em média, mais da metade da renda se concentra nas despesas de energia elétrica, gás de cozinha, água e esgoto, saúde e educação”, disse o estudo.

O levantamento calculou o efeito líquido dos subsídios do Estado aos brasileiros –excluídas a carga tributária dos setores. Leia a tabela a seguir:

A pesquisa disse que as reformas tributárias no Brasil têm sido impulsionadas pela intenção de mitigar desigualdades sociais, mas que os cálculos de carga tributária efetiva sobre os mais pobres não consideravam políticas socioeconômicas que “consomem recursos que poderiam ser direcionados a investimentos estratégicos”.

E completou: “Ao se considerar benefícios e auxílios às pessoas de baixa renda, constata-se que o impacto redutor é mais expressivo nos 3 primeiros decis (faixa de renda), corroborando a hipótese de que os subsídios são subestimados, ao passo que a carga tributária indireta é usualmente superestimada em boa parte dos estudos divulgados”.

O ESTUDO

O estudo “O mito da hiper tributação dos pobres no Brasil” é de autoria de João Kleber Lima, Paulo Domingos Matos, Erik Figueiredo e Marcos Köhler.

Köhler já havia publicado em 2024 um estudo que acabou sendo usado como referência no mais recente. Leia a íntegra de “A hiper tributação dos pobres no Brasil: um mito influente” (PDF – 755 kB).

Para os pesquisadores, parte expressiva da população brasileira recebe uma série de subsídios ou provimento gratuito de bens e serviços, o que faz a alíquota efetiva dos bens consumidos “bem pequena”.

O estudo busca desconstruir o argumento de que os mais pobres são desproporcionalmente onerados pelos tributos. Para os pesquisadores, é insuficiente a análise da incidência de impostos sobre a cesta de bens e serviços consumidos pelos indivíduos de baixa renda: “Tais cálculos desconsideram subvenções e subsídios relevantes destinados aos grupos de menor renda, como a tarifa social de energia elétrica, água, transporte público e outros benefícios”.

A alíquota efetiva de tributação indireta para o grupo mais pobre pode ser reduzida em, pelo menos, 14,7 p.p. Dessa forma, a carga tributária que era de 23,4% passaria para 8,7%. Para calcular esse percentual, Köhler utilizou como referência somente a oferta de bens públicos de saúde e educação.

Os demais pesquisadores buscaram expandir o levantamento, incluindo outras subvenções e subsídios relevantes, como a tarifa social, energia elétrica, água, transporte público e outros. Para calcular a alíquota efetiva, o estudo utilizou como base os dados detalhados da POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares) de 2017-2018.

Ao incorporar todas as “correções relacionadas a subsídios e subvenções”, a alíquota efetiva (23,4%) do grupo mais pobre seria de 3,7%. O estudo disse que esse percentual é “significativamente inferior” à alíquota aplicada aos mais ricos.

Os pesquisadores defendem que é relevante incorporar os efeitos das transferências não monetárias e subsídios nas análises de alíquota indireta.

O levantamento indicou também que outros repasses às famílias mais pobres, como o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) e o abono salarial, não foram considerados, o que poderia diminuir ainda mais a alíquota efetiva.

TRANSPORTE E GÁS

O estudo afirmou que foi um avanço incorporar os efeitos de tarifa de água e energia na alíquota, mas que há limitações ao incluir o transporte coletivo e o gás de cozinha. Defende que há dificuldade em agregar dados homogêneos no tempo e no espaço para todas as unidades federativas do país. “A proporção aplicada dos subsídios varia consideravelmente entre os governos locais, resultando em diferentes dimensões reais dos benefícios desses repasses indiretos”.

O estudo dividiu as famílias brasileiras em 10 faixas de renda diferentes. Somente as 3 primeiras foram consideradas como beneficiárias do transporte coletivo às famílias. Os pesquisadores disseram que outros indivíduos de renda mais elevada podem utilizar os serviços, mas optou-se por não aplicar nas faixas subsequentes.

Os pesquisadores disseram ser preciso uma “perspectiva mais equilibrada à discussão” de tributação e alíquota indireta por faixa de renda.

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